sábado, 31 de janeiro de 2009

De volta à estrada

Quando entrei no ônibus que leva da pequena Ocotlán à cidade de Oaxaca, onde estou hospedado, restava apenas aquele maldito banco que fica localizado exatamente onde está o eixo do ônibus e as rodas. Sentei na poltrona que ficava no corredor, porque as pernas não serviam. Em seguida, um senhor entrou no ônibus e viu o lugar vago. Fez cara de cu, mas não abriu a boca. Até que eu o cutuquei e perguntei se queria sentar-se. E aí sua feição já mudou. Ele sentou, meolhou e soltou um “thank you very much”. Respondi com um “por nada”. “Usted habla español?”. “Si, hablo”. E a partir daí a conversa foi uma delícia. Juan Hernandes (me mostrou até a identidade) trabalha na terra, em terras que não são tuas. “A terra não é de quem trabalha, é de quem tem dinheiro e manda os outros trabalharem”, descreveu. Tem nove filhos. Um deles está nos Estados Unidos, onde ganha a vida do jeito que pode. É professor de física, mas não conseguia emprego no México. Os outros todos estão estudando. “Siempre hice inversiones em los estúdios de mis hijos”, falou com orgulho. Não lembro o que cada um faz, mas sei que dois são veterinários e uma é professora.
Juan se queixou do país um bocado. Do governo Panista, principalmente. E disse que a repressão no sul do México é absurdamente forte. “Aqui nos matan como se estuviesen cortando las uñas. Nadie habla nada porque tiene miedo”, referindo-se á perseguição aos jovens e aos herdeiros de indígenas por parte de quem manda no país. Disse que o povo quer terra e, mais que isso, dinheiro para poder trabalhar a terra. Me disse que, ao me ver, pensou que eu era americano. “Hay gente buena em los Estados unidos, pero la mayor parte no me gusta”, disparou, antes de lamentar a parceria do seu país com o que fica ao norte. “Hoy nuestro presidente esta viajando para hablar sobre el masacre em la Palestina”. Nâo entende - assim como eu – como podem deixar Israel fazer o que faz. Ou melhor, entende – assim como eu: “porque reciben la ayuda y lãs armas de los Estados Unidos”. Antes de baixar d ônibus, me cumprimentou, desejou o melhor para minha família e para mim e disse para eu aproveitar em Cuba: “me usta mucho la política de Castro”.
Buenas, aqui em Oaxaca há manifestações pró-Palestina em todas as partes. Já haviam me dito isso – e se confirma que quanto mais ao sul eu for, mais gente engajada políticamente vou encontrar. Afinal, é nessa região que estão os estados mais pobres. É aqui que estão os zapatistas. Mas é aqui também que o exército e a polícia reprimem mais.

Adiós D.F.

Deixar a cidade do México para trás me doeu mais do que imaginava. No fim das cntas, fiz boas amizades no albergue, especialmente com as gurias que trabalhavam nele, assim como também com os japoneses na escola de espanhol. As primeiras providenciaram uns cartões postais do Zocalo, que sabiam, era a minha região preferida da cidade e escreveram mensagens que vou guardar pra sempre. Já os amigos japoneses me chamaram para um bar para beber. Tava muito engraçado, ainda mais que se emborracham logo.
O problema de ficar muitos dias sem escrever é que se esquece fácil do que ficou pra trás. Mas vou tentar recapitular um pouco. Buenas, fui a dois jogos de futebol. Um do Cruz Azul contra o Atlas. Massacre de 4 x 0 para os donos da casa. O outro do Pumas contra o Santos. Mísero 1 x 0 com golzinho de pênalti. Apesar do resultado, o bom mesmo foi o segundo, no Estádio Olímpico de 1968. O futebol deixa um pouco a desejar, mas a torcida é divertida e bem apaixonada. Os hábitos alimentares também são algo... Acho que já escrevi isso, mas repito: o esporte nac ional mexicano é comer. Caraca, onde você for vai encontrar comida, com certeza. E nos jogos não é diferente. Passa gente vendendo tudo quanto é tipo de comida. E é impressionante o quanto se come. Claro que tudo apimentado e, por isso, a cerveja é uma questão de tempo. No estádio do Pumas, elas vinham em verdadeiros baldes. Não é uma queixa, só uma contestação, afinal, não posso cuspir no copo em que bebi!
Oura coisa que fiz foi percorrer o bairro de Coyocán todinho. Já havia estado por lá, no Museu da Frida, mas não tinha dado ao bairro a atenção que todos me diziam que ele fazia por merecer. De fato, o lugar e bonito, acolhedor. Aproveitei para passar pela casa do Trostski. Mas não pude entrar, porque estava fechada.
Ah, também fui à Basílica de Guadalupe, que já supera o Vaticano em número de visitantes. O complexo formado pela nova e velha Basílicas, a Capilla Del Cerrito, o Templo Del Pocito e pela Capilla de los índios é muito bonito. Há ainda outras atrações, como um gigantesco relógio em que há apresentações da história das aparições da virgem e, ao seu redor outras marcações de tempo, como o calendário azteca. Muita gente entra no complexo religioso de joelhos e vai dessa forma até o interior do templo principal. No pátio, há de tudo, de dança folclórica a vendedores de chicharrones. O lugar é bonito, creio que quem vai ao México deve conhecê-lo, mas tenho certeza de que os “meu Deus” que eu dizia diante do que via tinha um sentido bem diferente daqueles que iam até ali por fé.

Tlatelolco

Em Tlatelolco está a Plaza de las Tres Culturas. Recebe esse nome porque numa área relativamente pequena, há prédios que representam três fases da história mexicana; o templo mexica de Tlatelolco, que foi uma cidade gêmea à de Tenochtitlán; o Templo de Santiago, construído pelos espanhóis com as pedras da antiga cidade azteca; e também prédios modernos. Mas talvez o lugar seja mais conhecido, hoje, pelo massacre de 1968, quando o governo mandou abrir fogo contra centenas de jovens manifestantes que faziam uma manifestação às vésperas da Olimpíada. Mais de 300 jovens morreram, ainda que as estatísticas oficiais apontem bem menos.
Teotihuacán

Os egípcios que me desculpem, mas Teotihuacán é fundamental. Situada 50 quilômetros longe da cidade do México, essa verdadeira relíquia impressiona pelo tamanho e pela beleza. Suas duas maiores estruturas são as pirâmides da lua e do sol, sendo a segunda a terceira clocad ano ranking mundial de pirâmides. Tudo é grandioso. A calçada dos mortos, que corta a cidade de um lado a outro deve ter bem uns 5o metros de largura e é cercada por antigos prédios onde chegaram a viver 250 mil pessoas. O Palácio de Tapantitla, que requer um fôlego extra do visitante porque está do lado de fora do parque, reserva o palácio Tlalocan, ou seja o Paraíso de Tláloc (que era o Deus da chuva). Ali estão preservadas pinturas impressiontes do deus e de hábitos como o jogo de pelota.

Top 5

Como fã do Alta Fidelidade, não podia deixar de eleger as cinco melhores coisas da estada na Cidade do México:
1. Teotihuacán
2. Zócalo: a praça principal da cidade é tudo de bom. Seja pela gente de todo o tipo, cor e tamanho que circula por ali, seja pelos exuberantes prédios que o rodeiam.
3. Bosque de Chapultepec: uma paixão dos locais, o Bosque é um dos principais destinos nos finais de semana e reúne alguns dos principais atrativos culturais da cidade em seu interior ou imediações.
4. Frida e Diego: ver as obras de Frida em sua casa ou nos museus de arte, bem como contemplar os fantásticos murais de Rivera é demais.
5. Gente: os mexicanos da capital são, ao mesmo tempo, mais fechados e mais abertos que os de outras partes. Como em todas as metrópoles, às vezes caminham como se não prestassem atenção a ninguém. Mas quando são abordados, sempre estão dispostos a ajudar, ainda que tenha um evidente problema de direção (sempre confirme com mais dois a informações que você pediu).

Oaxaca

Me falaram tanto de Oaxaca, que confesso que estou decepcionado. Só em um sentido não exageraram. A comida é muito boa. É a mais famosa do México. Cidade é bonita, cheia de prédios cloniais, com uma praça central belíssima, algumas igrejas interessantes. Mas nada tão espetacular.
Hoje me mandei para Monte Albán, onde estão as ruínas de uma antiga cidade Zapoteca e que é famosa pelos “Danzantes”, figuras gravadas nas paredes de um dos prédios e que são bastante peculiares. Inicialmente, em razão de sua disposição e do aparente “movimento” das imagens, pensou-se que estavam dançando. Mas atualmente se sabe que retratam prisioneiros de outras tribos que eram oferecidos aos deuses. Em muitas das figuras as genitálias estão mutiladas, o que significa que os órgãos sexuais eram cortados como oferta aos deuses ou para serem utilizados em rituais de fertilidade. O lugar é muito bonito, mas depois de conhecer outros mais bem conservados, o impacto fica menor..
Ontem fui a Ocotlán, cidadezinha que fica a uns 50 km daqui, porque havia mercado. As comunidades de toda região migram para lá para vender de tudo: galinha, bode, roupa, comida, artesanato...Comi uma deliciosa empanada de Chile Amarillo, provei e comprei mamey, uma fruta ótima que desconhecia. E também adquiri alguns famosos alebrijes, tipo de artesanato local. São bichos de madeira pintados de uma forma bastante original e colorida. Depois segui com o ônibus (aquele em que conheci o Juan) a San Bartolo, localidade famosa por seus artigos de “barro negro”. Fui na Casa Doña Rosa, onde essa técnica foi “redescoberta” há algumas décadas. Os primeiros exemplares de cerâmica negra foram descobertos na região por arqueólogos no Monte Albán, e Rosa desenvolveu o método pelo qual conseguia replicá-los. Tudo feito naturalmente. As peças são muito bonitas e resistentes. E o neto dela, Valente, que trabalha há 698 anos com cerâmica, faz uma demonstração de como preparar um vaso que humilha gente com pouca habilidade artística como eu...
Buenas, vou nessa e tentar ser um pouco mais rígido comigo para escrever com mais freqüência. Amanhã parto para San Cristóbal de las Casas. De lá vou a Chetumal. De Chetumal a Cancun. E de Cancun para a Ilha.
(.P.S. depois reviso o texto)

Beijos e abraços

Um comentário:

Fernando Cesarotti disse...

Rapaz, estás guardando todas essas anotações aí pra escrever um livraço quando voltar, né não?
Grande abraço e boas aventuras!